A profissionalização da gestão como porta de saída da crise no pós-pandemia

Ainda perdura na mente de muitos empresários a realidade da última década do século XX, a prática de colocar preço nos produtos dobrando o valor dos custos, ou que se pode perder um cliente que logo outro ocupará o seu lugar.
É conhecido no mundo do marketing que fica mais em conta fidelizar um cliente do que investir na conquista de um novo.
Antes que o negócio sofra um revés e mesmo que na atualidade as coisas estejam indo bem, é aconselhável investir um tempo para repensar os modelos de gestão em curso para fazer aperfeiçoamentos que podem dar maior musculatura para atuar em um mercado cada vez mais competitivo e exigente.
Famílias de empresários encaminham seus filhos para estudar Administração, Contabilidade, Comércio Exterior e Economia na expectativa que eles sejam a futura geração a tocar os negócios. Porém, não se preparam para receber sugestões dos filhos enquanto ainda são estudantes, querendo introduzir mudanças na organização. Certa vez, em uma dessas situações, pudemos acompanhar um estudante cujo pai era proprietário de uma empresa de higienização industrial. O pai achava que o filho ainda era “verdinho” para interferir nos negócios e o filho achava que o pai não lhe dava uma oportunidade. Conversando com ambos pudemos ver que ambos, de certa maneira, estavam certos, porque a empresa havia chegado até aquele momento bem pelos méritos e ações do pai, mas que, para se atingir novo patamar, novas mudanças precisariam ser introduzidas e isso denominamos de predisposição para a profissionalização da gestão.
Dessa forma, Lodi (1993) afirma que a profissionalização acontece dentro de uma empresa familiar ou tradicional quando se assumem práticas administrativas mais planejadas e menos personalizadas, tendo por base fatos e informações racionais.
Lodi (1996) citado por Uller (2002) argumenta que a profissionalização nas pequenas empresas, via de regra, acontece de três formas: êxito na integração de profissionais familiares na direção e na gerência da empresa; na adoção de práticas administrativas mais racionais; e em recorrer a consultorias e assessorias externas quando necessário, não enxergando essa última ação como despesa, mas sim como investimento. As consultorias podem ser importante ponto de apoio para a redução de custos e alavanca para a inovação.
A profissionalização da gestão pode ocorrer na área financeira, no marketing, nas operações, na área de recursos humanos, tratando apenas das maiores áreas de uma empresa, isto quando existem dessa forma na estrutura organizacional ou que as funções estejam concentradas nas mãos de algumas pessoas.
É importante se saber no aspecto do planejamento como a empresa captura informações externas e internas, as processam, estabelece objetivos, metas e indicadores que permitam, posteriormente, se fazer um controle sobre o realizado.
Algumas empresas se saem bem no planejamento, mas depois se perdem na organização, não sabendo como distribuir as tarefas frente a sua capacidade instalada, ou concentram a autoridade, com receio de delegar poder aos níveis abaixo da estrutura da organização.
Observa-se que hoje as empresas adquirem um nível maior de consciência, entendendo que lucratividade não é uma questão de ganhar muito no curto prazo. Elas estão aprendendo que o investimento em novas tecnologias, na preservação do meio ambiente, no cumprimento da legislação e no tratamento digno de seus colaboradores são aspectos que pavimentarão o acesso ao futuro sem sobressaltos.
Obviamente, duas opções seriam as mais recomendadas para suportar o ambiente empresarial que se aproxima de maneira mais intensa. Uma delas é a que contempla executivos jovens, ou júniores, com modelo mental atualizado no ambiente tecnológico. Outra opção é a de executivos experientes ou sêniores, voltados às mudanças e adaptações profundas.
Outro aspecto que a profissionalização exige é a separação do bolso da pessoa física e da pessoa jurídica. Ter uma gestão financeira e de registros contábeis profissionalizada exigirá disciplina e ausência de atropelos a quem estiver com a responsabilidade de cuidar das contas da empresa.
No marketing todo o esforço da empresa será no sentido de obter informações de mercado num sentido amplo (fornecedores, clientes e tendências internacionais) e transformar essas informações em produtos e serviços para colocar a empresa numa posição tal para que seja sempre lembrada pelos clientes, sejam eles do mercado de negócios que exercitam compras mais racionais ou do mercado de varejo que exercitam compras onde o impulso é um dos componentes.
Nas operações, apresentar confiabilidade na qualidade do produto ou serviço prestado, na logística de entrega e oferecer um preço que o consumidor identifique que vale a pena pagar pelo benefício auferido.
Nas relações com os colaboradores, garantir competências e comprometimento que mantenham a empresa operando. Isso somente será possível se houver satisfação com as práticas de gestão de pessoas que a empresa venha a adotar, a começar pela forma de tratamento que a liderança da empresa dispensará aos trabalhadores e também quanto aos aspectos de remuneração, incluindo os benefícios, desenvolvimento, treinamento e preservação da saúde (principalmente nessa época de pandemia), incluindo o próprio trabalho híbrido como uma possível alternativa.
Nas finanças a empresa deveria procurar trabalhar com um orçamento que contenha critérios claros para a alocação de recursos, um fluxo de caixa que não seja um mero contas a pagar, um sistema de apuração de resultados que seja resultante das metas pré-estabelecidas e que o financiamento do crescimento da empresa seja, se possível, resultado de capital próprio ou de capital de terceiros, porém de forma equilibrada, não colocando em risco a capacidade de pagamentos.
No comando da empresa as estratégias devem ser estabelecidas de forma colegiada, incluindo aspectos relacionados à sucessão e a minimização de riscos ao negócio.
Para tudo funcionar, a mudança de uma empresa tradicional para uma empresa profissionalizada se inicia com a vontade de quem detém o poder maior, ou seja, o proprietário ou seu preposto, mas exigirá, para se atingir o grau de maturidade, muita persistência e determinação nos propósitos. Não será do dia para noite, sendo esse um processo a ser desenvolvido.
Segundo Frezattiet al (2017 p.615) a maturidade na empresa é colocada a prova pelo efeito das sucessões havidas e destacam: “Um efeito importante é que, quanto mais as gerações se sucedem, menor é a possibilidade da empresa se manter na maturidade, o que muda a expectativa de sinal constantemente positivo”. Por isso, mesmo que a empresa venha bem, com indicadores de profissionalização da gestão, qualquer descuido pode fazê-la regredir.
Esses mesmos autores dizem que “A questão da cultura na gestão da empresa pode trazer influência sobre o modelo de gestão adotado”. Todas essas ações devem ter como pano de fundo valores da cultura organizacional bem fundamentados, que permitam confiança nas relações interpessoais para inovar e conduzir a empresa na consecução da sua missão.
Para finalizar até os anos 90 do século passado a palavra de ordem era qualidade, e hoje a palavra de ordem é inovação. Uma empresa que pretenda ter perenidade no século XXI precisa inovar. A inovação deverá acontecer no produto, serviço, processo, sistema, atendimento, entrega, pagamento, show-room, vendas, assistência e assim por diante.
No entanto, para se profissionalizar nessa área, alguns conhecimentos serão importantes: devo investir em desenvolvimento ou comprar licenças de uso? O que devo saber sobre registro de propriedade intelectual para proteger aquilo que for de minha autoria? Como obter recursos para financiamento para projetos de inovação? Como outros tipos de organização, a exemplo de consultorias poderiam ajudar a empresa a chegar até esses recursos?
Foi pensando na recuperação pós-pandemia e no ambiente do pequeno e médio empresário que a Universidade Municipal de São Caetano do Sul – USCS realizou o diagnóstico de gestão empresarial voltado para a região do Grande ABC paulista nos meses de Junho e Agosto de 2021.
Esse diagnóstico foi composto de 13 funções empresariais e 130 questões aproximadamente. Cada respondente recebeu um relatório personalizado com comentários de analistas e foi constatado que nenhuma das empresas respondentes situou-se nos extremos, ou seja, não estavam em situação crítica de sobrevivência, mas também não possuíam a gestão empresarial totalmente estruturada. Como se trata de um processo contínuo os problemas apontados deverão continuar sendo tratados.
Referências:
FREZATTI, Fábio et al. Estágios do Ciclo de Vida e Perfil de Empresas Familiares Brasileiras. Revista de Administração de Empresas. DOI http://dx.doi.org/10.1590/S0034-759020170607, nov-dez, 2017
LODI, João B. A Empresa Familiar. 4. ed. São Paulo, SP: Pioneira, 1993.
ULLER, R. Profissionalização na empresa familiar: o caso da Perdigão Agro-industrial S.A. 2002. (Mestrado em Engenharia de Produção) Curso de Pós-graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
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