Sustentabilidade: estratégia, cultura e propósito em empresas familiares

A Pandemia da COVID-19 impactou os mercados e fortaleceu as evidências que denunciam as limitações relacionadas à forma como vivemos e como produzimos.
Nessa conjuntura, a lógica de mercado configura-se como um aspecto sobressaliente nas relações que estabelecemos, demarcando o horizonte cultural de nossa época e atuando com um agente “colonizador” dos processos de sociabilidade que estruturam a nossa forma de vida. E, dentre os efeitos mais perversos resultante da intervenção humana no meio, está a exploração predatória do meio ambiente, pautada, sobretudo, na utilização desequilibrada dos recursos naturais, difusão elevada de gases poluentes, na geração volumosa e disposição inapropriada de resíduos.
É praticamente impossível avaliarmos esse cenário sem aferir que as atividades produtivas capitaneadas por organizações configuram parte importante na aceleração dos efeitos nocivos oriundos dessa forma de vida. Para tanto, faz-se salutar repensarmos os paradigmas sob os quais as organizações estão estruturadas, e, nesse processo, a participação das empresas familiares é fundamental, sobretudo, quando identificamos a proeminência dessas organizações no contexto global dos mercados. Por quê?
Primeiro, porque as empresas familiares contribuem com mais da metade do PIB e dois terços dos empregos no mundo. Além disso, de acordo com o relatório da Family Business Survey 2021, realizada pela PricewaterhouseCoopers (PwC), apenas 37% dos líderes dessas empresas colocaram a sustentabilidade e a comunidade local como suas grandes prioridades.
Em contraponto, constata-se que, sobretudo, os jovens da geração Z (nascidos entre 1990 e 2010), preferem comprar ou investir em organizações alinhadas com os propósitos relacionadas à Governança, Responsabilidade Social e Preservação Ambiental. Ainda, os resultados da “Better Living Program” da Electrolux, nos mostra que 62% dos jovens colocam a sustentabilidade como a maior preocupação atual, estando dispostos, inclusive, a mudar drasticamente seu estilo de vida para salvar o planeta.
O imperativo posto à práxis administrativa configura-se, portanto, em conseguir coadunar intencionalidade de ganhos financeiros com as prioridades ecológicas urgentes de nosso tempo. E quais seriam os principais desafios?
A nível de Brasil, o primeiro ponto a ser revisto associa-se aos aspectos culturais, dentre os quais destacamos a dificuldade em conseguir aplicar verdadeiramente práticas de governança atreladas à ESG (Governança Ambiental, Social e Corporativa) de forma institucionalizada. A barreira cultural é fortalecida, sobretudo, pela falta de conhecimento e disseminação ampla de padrões e indicadores globais associados a essas práticas e que possam ser incorporados a gestão de cada organização.
A segunda questão, que de certa forma associa-se a essa, reverbera na formulação de uma estratégia organizacional que incorpore em suas metas e objetivos os princípios da sustentabilidade. No Brasil, apenas 39% das organizações afirmaram ter uma estratégia definida (PwC, 2021) a partir do propósito sustentável.
A terceira questão repousa na visão de longo prazo e na afirmação de um propósito que apresente a importância de as organizações existirem e a forma como pretendem impactar o mundo. Na empresa familiar o processo de amadurecimento do propósito passa pelos valores. Estes são transferidos da família para a empresa, amalgamando-se com todas as relações internas ou externas à organização. Nesse campo, o desafio pode estar posto no sentido de “atualização” dos valores de acordo com imperativos contemporâneos. Concorda-se sobre a relevância de manter esse legado nos processos de mudança, uma vez que a ele se conecta a identidade, conhecimentos e competências acumulados ao longo das gerações. No entanto, faz-se necessário conseguir dialogar com demandas presentes, e, nesse processo, conhecer profundamente seus próprios valores e competências, é fator facilitador no sentido de adaptar novos imperativos ao propósito da organização.
Incorporar a sustentabilidade às formulações da estratégia, da cultura e do propósito organizacional, além de ser um fator urgente, converteu-se em fator de continuidade dos próprios negócios familiares. Cabe, portanto, aos líderes e gestores, despertar a consciência à essa demanda, e, de forma holística, avançar e realizar o melhor caminho com vistas a esse resultado.
Referências:
Better Living Program, (Report 2019) disponível em https://www.betterlivingprogram.com/
PricewaterhouseCoopers (Report 2021), disponível em https://www.pwc.com.br/pt/estudos/setores-atividade/pcs/2021/pesquisa-global-de-empresas-familiares-2021.html
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